Ser professor está-lhe no sangue. Tem o brilho nos olhos que só os bons professores trazem quando fala do ensino, das aulas, dos alunos, das histórias.
A história de Ricardo leva-nos a Olhão, de onde é natural. E começa como tantas outras: no início da vida adulta, aos 22 anos, surgem os primeiros sintomas de psoríase, primeiro no cotovelo, depois na pálpebra. O diagnóstico foi rápido: “O médico disse-me taxativamente que era psoríase.” O processo seguiu, “com pomadinhas”, mas novas mudanças trouxeram-lhe uma evolução drástica: “Na altura, estava já uma lástima, com cerca de 70% do corpo com lesões.”
Se, a princípio, o diagnóstico foi encarado com relativa normalidade, com o avançar dos sintomas, o dia a dia começou a ser seriamente afetado. O professor recorda a dificuldade em gestos tão simples como a roupa que escolhia, a sensibilidade da pele, as feridas que as lesões iam fazendo e que tornavam difícil esconder a doença.
A nível de tratamento, reconhece a importância do acompanhamento que conseguiu à altura, que resultou na toma de medicação oral e de fototerapia, mas, recorda, os efeitos secundários eram também grandes: emagreceu, perdeu o cabelo, e começou a notar problemas ao nível do fígado.
Sempre houve uma capa muito grande, a minha, em relação àquilo que eu era
Mesmo nesta fase, afirma – com merecido orgulho – nunca ter faltado ao trabalho por causa da psoríase. Nas aulas, as crianças “inicialmente faziam muitas perguntas”, mas a forma natural como ele próprio encarava a doença fez com que também elas o fizessem. Recorda que, quando a psoríase o afetava nas mãos, tinha inclusive de usar luvas, mas até nas adversidades Ricardo vai buscar o humor: “Dizia que era o rato Mickey, e as crianças até queriam experimentar.”
Por fora, aparentemente, estava tudo bem: o professor lidava com os sintomas e encarava a doença de uma forma positiva, não deixava que ela o parasse, não permitia que se imiscuísse no dia a dia. Por dentro, a história era outra. À luz da distância, Ricardo reconhece agora que “usava uma capa”, em que aparentemente estava tudo bem, e em que recorria ao humor para desvalorização. Mas sabe de cor: foram sete anos de aparente bem-estar. Hoje reconhece que deveria ter procurado, também, ajuda profissional na saúde mental, porque a psoríase é, sublinha, uma doença “que mexe demasiado com a autoestima”. Defende que este acompanhamento deve ser feito a par com o dermatologista, “desde o primeiro dia”.
No meu caso, foi uma autoestima disfarçada. Depois paguei o preço
A força de Ricardo, no entanto, não esmoreceu. O próprio afirma andar “sempre à procura de novas respostas”, e encontrou a que procurava: “Desde que comecei a fazer os tratamentos biológicos a minha vida transformou-se completamente.” Nos últimos cinco anos e meio, as manifestações passaram de um estado lastimável para “pequenas manifestações”, junto às orelhas e no couro cabeludo. Manifestações grandes, nunca mais as teve.
O tratamento ajudou a melhoras “do dia para a noite” e em três meses e meio voltou “a sentir a elasticidade do corpo”. Atualmente faz a administração dos biológicos, e mesmo com o corpo livre de grandes lesões, continua o acompanhamento contínuo em especialidade. Sabe que o tratamento tem riscos, mas que lhe devolveu a qualidade de vida que tanto procurava.
Quero sempre respostas, preciso de obter uma resposta preto no branco do porquê
A nível de comorbilidades, Ricardo refere que apenas tem diagnosticada hipertensão, para a qual é também medicado. Ainda que seja, atualmente, a única associada, sabe que a psoríase é uma doença que pode trazer outros problemas e, por isso, sublinha a importância de um diagnóstico precoce.
Hoje em dia, admite, ao ser acidentalmente diagnosticado com um carcinoma renal, questionou os riscos dos biológicos. O médico que o segue já lhe transmitiu que não existem riscos, não existe relação, mas pretende continuar a procurar mais informação e respostas: “Nós não podemos ficar acomodados àquilo de que padecemos”.
Acredita que “a empatia com o dermatologista” é fundamental para que haja um trabalho conjunto entre médico e paciente, e sublinha a necessidade de se procurar também, precocemente, ajuda “a nível de terapia”, para se lidar com o diagnóstico e com o curso da doença. O diálogo entre pares é também, para Ricardo, da máxima importância, ou não fosse ele professor: “Falar com os outros, ouvir histórias, chamar a atenção é extremamente importante!” O próprio admite que, para ele, foi uma forma de “acalmar as ansiedades”, porque as conversas com especialistas, com tanta informação, acabam por não assentar nos doentes. Ressalva, ainda assim, que conversar com doentes não significa copiar um tratamento, porque “cada caso é um caso”. Um pouco como nos testes, Ricardo!
Nós não devemos ficar acomodados àquilo de que padecemos. Há respostas, felizmente!